Por J.B. Serra e Gurgel (*)

Almerinda Gurgel Valente, rebatizada por Nenem por seu irmão Francisco, nasceu em 10 de outubro de 1894, na cidade de Quixeramobim/CE. Filha de Henrique Gurgel do Amaral Valente e Joana Gondim Valente.

Almerinda era irmã de Francisco Gurgel Valente, Minervina, Antonia, Lidia, Dionisia, Mariinha, Perpétua,Henrique e Raimundo.

Acompanharam até Lages os seus pais, ele,Henrique, fornecedor de mantimentos para os trabalhadores da Estrada de Ferro de Baturité,que se implantava de Fortaleza ao Crato..

Chico Guilherme veio de Quixeramobim para Lages, filho de Chico Guilherme, de Tauá de uma família de 22 irmãos: Pedro, Francisco, Almerindo, Antnio, José,Nô,Elvira,Noca, Guilhermina, Francisca, Maria,Espirito Santo,Magdala,Teodolina, Julia e Donana, do 1º.. casamento e Francisco, Luiz, Geraldo,Deuzinha, Alice e Odete, do 2º. Alguns deles foram para Lages: Pedro que vendia garapa perto da estação,Almerindo que casou com sua prima Felicia, José (Zeca) retratista que ficava em Lages e Senador Pompeu, Marica, mãe de d. Urcezina, casada com José Marques Filho, Noca que casou com o veio Joca, morador de Chico Guilherme..

As duas famílias Gurgel do Amaral Valente e Guilherme Holanda Lima ocuparam os espaços foram deixados pelos Lages, que deram nome ao lugar.

Almerinda casou-se em 23.09.1911, com Francisco Guilherme Holanda Lima, mais conhecido por Chico Guilherme, comerciante, pecuarista, agricultor, empresário. Casamento oficializado pelo Padre José Coelho de Figueiredo Rocha, na Capela de Nossa Senhora do Pérpetuo Socorro,de Lages , então distrito de Telha, hoje Iguatu, sendo testemunhas Antonio Castro e Antonio Henrique da Silva.

Dizia-se que Henrique e Chico Guilherme dividiram mapa de Lages ao meio, e que sem,se imiscuirem na política, entregaram o poder político a outras famílias que foram chegando.. Também consta que Henrique, menos atirado aos negócios, fora certa vez vereador em Telha,hoje Iguatu, representando a comunidade de Lages.

Dessa união nasceram 14 filhos: Teodelina, Antônio Guilherme, Pedro Guilherme, Adelaide, José Guilherme, Maria, Rosmarie, Madalena, Terezinha, Luiz Guilherme, Francisco Guilherme (I), Francisco Guilherme (II), Raimundo Guilherme e Joana Gurgel Holanda (Janete). Como 14 filhos eram poucos, adotou como filho o jovem Alcebíades da Silva Jácome,, que acabaria casando com a filha mais velha, Teodolina (Teó)_

Chico Guilherme abriu a primeira loja de tecidos com o nome Casa São Francisco, que ficava na Rua Manoel Ferreira Lima, lado sul do atual Mercado Central, depois abriu a primeira indústria de compra, venda e beneficiamento de algodão, a Usina São Francisco, localizada na Rua Santos Dumont .Ele e Nenem tornaram-se proprietários de várias fazendas de gado e plantio de algodão,caprinos, ovinos, eqüinos e gado de leite e abate, em Catanduva, segunda residência do casal para descanso nos fins de semana, recepção dos familiares e amigos para festas, almoços, confraternizações e reuniões de negócios.

Chico Guilherme e Almerinda construíram a mais bonita casa de Acopiara, no estilo “art nouveau” na sua Santos Dumont, com forro e ventilação por baixo do assoalho, com muito espelho, cristais e água encanada, movimentada por um catavento que ficava no muro (quintal). A casa mais tarde foi alugada ao juiz de Direito, Candido Couto, e tia Nenem foi morar na casa de sua filha Janete. No inventário ficou para a sua filha Adelaide, que foi casada com o prefeito Alfredo Nunes de Melo, e depois para seus herdeiros. No local, hoje, está o supermercado Albuquerque.

Devota de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e de São Francisco, Almerinda o o terreno para a construção da Casa Associação das Filhas de Maria, apedido de sua irmã, Lídia, para retiros espirituais onde as jovens solteiras se tornavam Filhas de Maria, usavam uma fita azul no pescoço com uma medalha de Nossa Senhora e outra fita mais larga na cintura igual as que tem na imagem de Nossa das Graças. Casadas, passariam para a Associação das Mães Cristãs, que existe até hoje.

Almerinda gestionou para que Chico Guilherme doasse terrenos para a Igreja matriz, casa paroquial, praça, hospital,escola,correios,cemitério, o que feito com desprendimento.

Janete lembra que Nenem foi Mãe de Leite de várias crianças, inclusive de seu sobrinho Agamenon Gurgel Pinheiro alimentando-o por um bom tempo e este passou a chamá-la de Mãe.

Almerinda era muito querida pelos irmãos e sobrinhos, a que socorria nas suas necessidades. Não foi sem razão que emprestou dinheiro, sem juros,para que seu sobrinho, Nertan ,pudesse abrir uma casa comercial, a Casa dom Bosco.

Em 29 de novembro de 1981, no Hospital e Maternidade Júlia Barreto, Nenem nos deixou, morrendo de morte natural aos 87 anos, na presença do médico Dr. Barbosa, de seus filhos Joana Gurgel Holanda e Luiz Gurgel Guilherme.

(*) JB Serra e Gurgel, (Acopiara), jornalista e escritor, com Joana Gurgel Holanda (Janete, filha) e Idalmi Pinho Guilherme (neto) de Almerinda.

 

 

Chico Guilherme, a hora e a vez do  Coronel

 

Por Jb Serra e Gurgel (*)

 

Waldy Sombra, casado com Maria Julia, uma das netas de Chico Guilherme, escreveu: “Há pessoas que nascem na sombra e se criam no silêncio. Chico Guilherme foi uma delas”.

Nasceu em 15 de março de 1890, no, sítio Salva Vidas”, de seu pai, em Quixeramobim. Em 1910, com 20 anos, foi para Lajes, depois  Afonso Pena e mais tarde, Acopiara,, onde viveu por 54 anos. “Impossível é andar em Acopiara sem que não se tenha de pisar em terra dada de mão beijada à comunidade pelo Coronel Chico Guilherme”, assinala Waldy Sombra, ressaltando que ele doou os terrenos da Casa Paroquial, da matriz de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, da Praça Monsenhor Coelho, do Cemitério, da Associação Comercial, do Grupo Escolar padre João Antonio de Araujo, dos Correios e Telégrafos, do Clube Social.

O desabafo de Waldy Sombra é todos os descendentes de Chico Guilherme: “nesta cidade, nem rua, nem praça, nem bairro, nem viela evocam o nome do benfeitor”.

Por que?  Ninguém responde. O silêncio vem de longe e não se sabe se vai para Iguatu,  Mombaça ou Senador Pompeu. Que teria feito Chico Guilherme para lhe ser negado o reconhecimento? Por que não a pagar o tributo devido a um pioneiro, empreendedor, doador, que não fez mal a ninguém e que deixou uma descendência numerosa? Não me atrevo a buscar razão ou razões, mas desde logo deixo consignado que, se existirem razão ou razões, são bem menores que a sua grandeza.  Se tivesse como, convocaria a acopiarense ´para prestar as justas homenagens  devidas a Chico Guilherme.

Não exerceu mandato político, mas foi a “alma viva”, fiel aliado e financiador,  do maior cacique político de Acopiara, Celso de Oliveira Castro. Pessedista e getulista, guardava e hoje, sua filha Janete guarda, um pequeno busto que o Presidente Getulio Vargas lhe presenteou  na década de 30, enviado do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. Era conservador  mas não reacionário. Fidalgo, cordato, educado, fino, nobre nas atitudes. Dizer que pertencia à nobreza é uma injustiça, se tomarmos o conceito europeu e clássico de nobreza. Era burguês, sim, mas não era arrogante nem prepotente. Era manso. Não era culto, mas  informado e atualizado com o mundo que o cercava..

Ascenete Monteiro Guilherme tem 95 anos é o último dos 18 irmãos de Chico Guilherme, viva, lúcida  e morando em Acopiara, escreveu à mão algumas anotações sobre sua família e delas consta que Antonio Guilherme Holanda Lima, patriarca ,  “jovem holandês veio para o Brasil em um navio negreiro” que aportou no Recife. De Pernambuco seguiu para Quixeramobim, no Ceará, onde fixou residência. Lá tornou-se proprietário da fazenda de gado “Salva Vidas” e conheceu Teodolina Gomes com quem se casou e teve 18 filhos. Morreu em 1932 em Quixeramobim.

Em 1910, Francisco Guilherme Holanda Lima, conhecido como Chico Guilherme, desembarcou, de trem em Lajes, e  abriu uma loja de tecidos, a Casa São Francisco, na atual rua Manoel Ferreira Lima, no lado sul.

A primeira residência do casal foi na atual rua dom Quintino, ao lado do Centro Social de Acopiara, na saída para Iguatu, A segunda, construída em 1919, fica na Rua Cazuzinha Marques, 160,  que durante anos foi alugada ao juiz de Direito Candido Couto e depois foi residência de sua filha Adelaide Gurgel Nunes, esposa do prefeito Alfredo Nunes de Melo (1955-1959). O histórico casarão, um dos mais lindos de Acopiara, segundo sua filha, Janete,  foi demolido e , em seu lugar, implantado um supermercado. Sua neta, Heloisa, e sua bisneta, ex-prefeita, Sheila, tentou transformar o casarão em centro cultural e teria meu total apoio, mas não foi adiante.

Chico Guilherme conheceu  Almerinda Gurgel Valente, mais conhecida por Nenem, nascida em 10 de outubro de 1894, filha de Henrique Gurgel do Amaral Valente, o vovô do Rio, e de Joana Gondim Valente,  com quem se casou  em 25 de setembro de 1911, sendo oficiante o padre José Coelho, de Iguatu. O casal  teve 14 filhos.

Depois da loja comercial, abriu  a primeira indústria de compra, venda e beneficiamento  de algodão,a usina São Francisco,  localizada na rua Santos Dumont , depois Cazuzinha Marques.  Mais tarde vendida a Francisco Gurgel Valente, seu cunhado.Com a usina de Algodão. Lajes vivenciou  o inicio de seu progresso.”A criação de novos empregos e a circulação de dinheiro na pequena Lajes não foram os únicos benefícios da fábrica, pois foi através dela que cidade pôde sair das trevas. A luz era puxada à motor da própria fábrica”, registrou Ascenete.

Com os negócios prosperando, Chico Guilherme tornou-se proprietário de uma fazenda de gado no sítio Catanduva, Comprara do padre Leopoldo Rolim.

Na área do Prado, Chico Guilherme cedeu terreno a Quintino Cunha, que foi juiz de Direito em Lajes, onde construir uma casa com árvores, animais e catavento, onde recebia amigos para “o leitão recheado por suas próprias mãos”. Foi Quintino quem sugeriu a dar à filha o nome de Rosmarie (1923)  hoje viva, como ele o fizeram em relação á sua filha, Rosmarie Eitel, do terceiro casamento. Na casa de Quintino Cunha também morou outro juiz de Acopiara, Carlyle Martins.

Ainda na área do Prado, implantou a nova Usina São Francisco que deu lugar mais tarde à exportadora Cearense e mais recentemente à Usina de Algodão e Oleo, de Francisco Alves Sobrinho, prefeito municipal (1959-1963)

Como verdadeiro pioneiro foi dele o primeiro caminhão que apareceu em Acopiara,  um Ford à manivela, guiado pelo motorista conhecido por Cipoada, que passou a transportar os fardos de algodão da Usina para a estacão ferroviária, antes levados pela carroça do Ioiô.

Muitas vezes vi o coronel Chico Guilherme passar com sua indumentária predileta – gandola, botas e chapéu, com um revolver de cano longo. Outras vezes o vi chegar e partir para  Catanduva montado no seu cavalo. Em outras, andando na rua, despreocupado, sério, calado.

Chico Guilherme morreu em 10 de maio de 1964, na sua Fazenda Catanduva, entre 18h30 h e 19h.Na noite chuva, a cavalo, o morador José Luis veio trazer a notícia aos membros da família- “Coronel Chico Guilherme é com Deus....”. De imediato, os genros João Holanda Lima e Júlio Holanda Lima, em companhia de Lourival, foram de camionete trazer o corpo para ser velado no cidade , na grande da Santos Dumont, 160.

Seus irmãos do 1 matrimônio de seu pai: Pedro , Francisco, Almerindo, Antonio, José, NÔ, Elvira, Noca, Guilhermina, Francisca, Marica, Espirito Santo, Magdala, Teodolina, Julia e Donana  Guilherme de Holanda.

Seus filhos: Teodolina Gurgel Holanda Jácome, Antonio Gurgel Holanda, Pedro Guilherme Sobrinho, Adelaide Gurgel Nunes, José Gurgel Holanda Lima, Maria Gurgel Lima, Rosamarie Gurgel Lima, Madalena Gurgel Rodrigues, Teresinha Gurgel Guilherme, Francisco Guilherme Filho, Luis Gurgel Guilherme, Raimundo Gurgel Guilherme, Joana Gurgel Holanda.

(*) JB Serra e Gurgel, jornalista e escritor (Acopiara)

 

 

Acopiara – o centenário de Alcebíades da Silva Jacome

 

Por JB Serra e Gurgel (*)

A família de Joaquim Jácome Silva no Ceará se estruturou a partir de quando ele veio transferido do Exército, do Acre, para o Ceará, fixando-se em Senador Pompeu.

Conheceu Maria Cecília Elpídio , alta, morena clara, apaixonou-se e casou , nascendo desta união: Aluísio , 1902, Acrísio, 1907, Carminha,1908, Alcebíades, 1909, Luzia, 1910, e Fransquinha, 1912.

Joaquim faleceu em 1914, deixando a família no desamparo. Tempos bicudos.

Maria Cecília, cinco anos depois, casou-se com o tabelião Raimundo Viana. Engravidou e morreu de parto de Maria Cecília Elpídio, nome também dado à menina.

Os filhos , sem pai e sem mãe, foram morar com os tios, Aluisio foi viver com o tio Francisco,em Lavras da Mangabeira ,conhecido por Quinho, que o maltratou. Mudou-se para Lages, que ficava entre Telha e Senador Pompeu, e foi embora para o Rio de Janeiro.

Acrisio foi para a casa de seu Antonio (Tó) Henrique da Silva e Minervina Gurgel, em Lages, Alcebíades para a casa de Julio (Tó) Elpídio da Silva e Antonia Gurgel, sendo que aos 13 anos começou a trabalhar como caixeiro na loja de tecidos de Francisco Guilherme.

Carminha e Fransquinha ficaram em Senador Pompeu morando com uma tia, Eliana, irmã de Maria Cecília,. Já Luzia foi adotada pela avó materna.

Alcebiades cresceu em Lages, depois Acopiara, e acabou casando com Teodolina (Teó) Gurgel Guilherme , filha de seu patrão, Chico Guilherme e Almerinda Gurgel Guilherme. Ela estava noiva de João Holanda Lima, comerciante vindo de Tauá, sendo obrigada a terminar o noivado por ordem do pai.

Do casamento com Teó, nasceram Francisco (1934) , Célia (1935), José (1938), Alcebíades (1940) . Almerinda, Maria Selma (1943),Bernadete (1947) Maria Almerinda ( 1950) e Miguel (1954).

Com múltiplos negócios em Lages, em todas as áreas de agricultura, comércio, industria, pecuária, terras. Chico Guilherme que também era líder político, chefe ostensivo do PSD, não se importou em passar a sua casa comercial de tecidos e miudezas para o seu genro, Alcebíades. Também ajudou na construção da residência de Alcebíades e Teó na casa que ficava à Rua Marechal Deodoro, 250, hoje Francisco Gurgel Valente.

Religioso, Alcebíades tornou-se freqüentador assíduo das festas religiosas, organizadas pelo padre João Antonio de Araújo, relacionadas com o padroeiro São Sebastião e com a padroeira, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Tornou-se irmão do Santíssimo e exibia sua opa vermelha nas comemorações Contou à sua nora Ivonete que certa vez o bispo do Crato, dom Francisco, ao realizar visita pastoral de crisma a Acopiara, Alcebíades apareceu com grande quantidade de afilhados. O bispo ficou surpreso e perguntou: “são todos afilhados, mesmo”? Ele confirmou, dom Francisco sorriu e disse: “Padre Cícero de Acopiara”!. Sua religiosidade levava a colocar, todas as noites, flores na imagem de N. S. do Perpétuo Socorro e anualmente ia a Canindé visitar a Basílica de S. Francisco.

Integrou também o Circulo Operário, entidade ligada à Igreja e que tinha por finalidade assistir aos pobres de Lages em suas dificuldades.

No comércio, Alcebíades veio a ser fundador e presidente da Associação Comercial.

Na política, muito embora estivesse aliado ao PSD do chefe político Chico Guilherme, chegou a disputar mandado eletivo, de vereador, mas não se elegeu.

Seus filhos são unânimes nas considerações sobre suas qualidades.de dignidade, honradez, humildade, caridade, brincalhão, firmeza de caráter. Fortaleza nas adversidades e paixão pela vida. Seu filho mais velho, Francisco, conhecido por Jaile, ex-seminarista, afirma: “Meu pai para mim foi exemplo de vida e santidade”.

Almerinda: – “papai viveu para o bem. Ajudava as pessoas com desprendimento. Vendia fiado, mesmo sabendo que as pessoas não podiam pagar. Sentia-se feliz quando trazia para sentar à mesa alguma pessoa para almoçar com ele, mamãe e os filhos”. Na seca de 58, retirantes famintos invadiram Acopiara e começaram a saquear o comércio. Tomou então a iniciativa de convencer os saqueadores e parar com aquilo e com a ajuda de João Holanda distribuiu comida para todo mundo.

Célia conta – papai tinha uma grande preocupação quando algum de seus filhos adoecia. Chegava a ir três vezes em casa durante o dia , levando guaraná champagne e biscoito, levando conforto e nos animando; Nossos aniversários eram festivamente comemorados com bolo e parabéns. Ficava feliz quando após o almoço deitava numa rede e seus filhos estavam à sua volta.

Selma lembra = papai acordava cedo, levantava e acendia o fogo do fogão de lenha e colocava chaleira ppara ferver água e fazer o café. Geralmente cantava e se recorda de uma musica: “Meu Deus que horror! Meu Deus que aflição! Mataram uma caboquinha no caminho da estação”...Recorda que muitas vezes chegou em casa e Bete e Almerinda vinham cantando agarradas nele que as chamava de Barrica e Bodega. Sempre que entrava em casa, até a gata que criava disparava ao seu encontro.

Seus filhos homens cedo deixaram a casa paterna. Francisco foi para o Seminário do Crato, concluindo o Seminário Menor e passou a Fortaleza para fazer o Seminário Maior, mas deixou indo tentar a vida no Rio de Janeiro, depois Volta Redonda, onde se fixou. José foi para o Seminário Franciscano de Canindé, mas logo deixaria e foi para o Rio de Janeiro. Alcebíades não estudou no Seminário e acabou também indo para o Rio de Janeiro. Miguel teve uma passagem curta pelo Rio de Janeiro, mas retornou á Acopiara, seguindo a profissão do pai, como comerciante, não de tecidos mas na área de supermercado.

Os filhos lhe deram netos. Francisco casou-se com a professora Ivonete e tiveram três filhos, Francisco Jr, Frederico e Felipe. Célia casou-se com o médico Carlos Ivo de Novaes Menezes e tiveram três filhos, Ceres Leda, Carlos Ivo e Carlos Alberto. José casou-se com Maria Fernandes Alves, de Acopiara, e tiveram duas filhas, Patrícia e Clarissa. Alcebíades casou-se com Maria Emilia e tiveram filhos, Sameline, Saironi, Alcebíades, Carnelutti . Assumiu outro filho, Sergio Pompeu. Maria Selma casou-se com Afonso Feitosa Lima filhos: Vicente, Astrogilda, Afonso, Célia e Alcebíades; Bernadete casou-se e tem uma filha: Danielle, Almerinda foi casada duas vezes, do 2º casamento, tem dois filhos, André e Greice. Miguel casado com Antonia e filhos Gisele, Gean e Michella. Os bisnetos formam uma legião.

(*) JB Serra e Gurgel (Acopiara), jornalista e escritor.

 

 

João Holanda Lima: centenário de nascimento

 

Francisco Gurgel Holanda (*)

 

Sim...! Não sem, antes, eu num aperto. No mínimo, preocupado porque me sei a relacionar-me com as pessoas - até com as íntimas - sem caçá-las; virtude - ou será pecado? - da só minha peculiar personalidade e, talvez, de fatores outros que ignoro. Amo ou admiro alguém, e pronto! Não o dou a espiadas mais distantes da luz do facho afetivo. Afiei-me, pois, a querer bem com esse amor-âmago, assim naturalmente, como a flor faz para vir a ser flor e sê-la! Não vou às bordas - que até podem constar à benquerença, mas, lá onde elas, acolá ficam a não me vir prejuízo.

E aí, a mim que assim, sem a curiosidade, há: - Ora, sobre o pai, deve sabê-lo bem! Conhecer, um a um, fatos e... É... É, amigo! É o que ouço - Razoável, não? - da muda voz do sótão às suposições. E enquanto eu com esse meu jeito e as opiniões a me darem diferente, eis os poucos registros que os sei sobre meu saudoso pai. E o faço, penitenciado, pois o pouco, por pequeno, nunca serve à homenagem a um grande!

Vamos lá... Visito o raso baú e empurro-me: vamos! Vamos! Daí, e para festejar o centenário de nascimento de João Holanda Lima, meu genitor todo bom, passo a contar que ele nasceu em Tauá/Ceará, em 12/08/1910, filho de Júlia Holanda Lima e Luiz Teixeira lima. Estes, à moda de antanho, tiveram l2 filhos. Casal de agricultores, o cultivo foi singelo como lhes eram os bolsos e permitia a aridez da gleba. Teimaram misteres ásperos, como ainda hoje sói ao pobre que se atreve à semeadura em terras dos Inhamuns.

Certo dia – não peçam a data! – Júlia e Seu Lulu disseram: Vai o “João”. Foi assim que vovó e vovô resolveram o convite, feito por Pedro Alves de Oliveira e Carmina Teixeira Alves, para que um dos “meninos” (qualquer dos varões, irmãos desta) fosse morar com ela. Meu pai, o João acima e com idade ao derredor de dezoito anos, deixou, por tal, a casa paterna e veio para Afonso Pena, hoje, Acopiara.

Achou ruim? Não sei! A cavalo, tropeiro e com outros nessa forma de, à época, viajar o “humilde”, tocou-se por chãos adentro. Fora-se o estirão de léguas e a estreia de uma forte saudade sua. Decerto, sob um concerto por vozes viandantes, relinchos, chocalhos e guizos, afora o troar porque, fingem-se zangados, os cascos muares contra o chão. Atrás, ao João, o solo Tauaense e de seu leite! Depois, o de Maria Pereira, hoje, Mombaça, a supostas lágrimas! Enfim, João chegou ao da casa com a irmã!

Carmina quis o irmão ao bem. O pôs a ajudar seu esposo, Pedro, comerciante na nova terra ao meu pai. Este, apenas sabendo ler e as quatro operações aritméticas, já era - Severidade de casa – a comportar-se. Cristão, sim, porque a fé dos pais e a dos recém-anfitriões. Orientado, venceu as urtigas e prumos do mercadejar. Arrumou, a sã, sua nenhuma experiência. Ou, bem mais certo, o trato matuto que trouxera.

Ajeitado - Você acredita em destino? -, meu pai fez-se madeira boa, pronta e apta à obra. Pegou verniz boa cepa. Valeu-lhe estimularem-lhe a inteligência e o gosto pelo porvir. Devagar, entrosou-se socialmente. Não mentem isso, seus casamentos e essas suas atividades e ações: comercial, agropecuária, proprietário, Promotor de Justiça e participações sócio-político-religiosas; inolvidáveis, os louvores à família, aos pais, “dona Júlia” e “Seu Lulu”, a irmãos, e o trato amigo aos de seu largo relacionamento.

Casou. Primeiro, com Geraldina Vale Castro, filha de Maria Anísia da Silva Castro e Celso de Oliveira Castro, este, cidadão e chefe político de brilho moral ainda hoje a servir de exemplo. Viúvo dessa honra, João casou depois com Maria Gurgel Holanda, minha querida e saudosa mãe, nascida de Almerinda Gurgel de Lima e Francisco Guilherme Holanda; outro que senhor e cidadão, mas a quem Acopiara não soube, até hoje, premiar, por gratidão ao que ele, “doado do seu”, deu a bem geral dela.

Somos, desse enlace: Maria Heloisa Holanda de Albuquerque, formada em filosofia, casada com João Uchoa de Albuquerque, médico, ex-prefeito de Acopiara; Francisco Gurgel Holanda, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, casado com Lúcia Maria Bezerra Gurgel, Procuradora de Justiça; João Maria Gurgel Holanda, funcionário público, casado com Maria de Fátima Alves Moreira; Luis Teixeira Neto, agrônomo, casado com Maria Perpétua Ramos Teixeira, professora; Maria Holanda de Oliveira, professora, viúva de Nicéforo Fernandes de Oliveira, amigo e ex-Procurador Geral de Justiça; José Holanda Sobrinho, falecido esposo de Maria Luiza Lima, empresária; Maria Consuelo Gurgel Holanda; Maria Celeste Gurgel Holanda; Sebastião Gurgel Holanda, assessor parlamentar-Câmara Federal, casado com Sônia Maria da Silva Holanda.

João, após aprender com o cunhado Pedro, pôs o “Armazém São João”. Aí, fez tamanhos, chamados tirocínio e muito trabalho. Comprou. Vendeu. Exportou e financiou etc. Benditos, a mamona, a oiticica, o algodão, in natura e em pluma, as quantas mercadorias, peles silvestres – não havia a consciência ambiental de agora - e o mais! E estes: Celso mouco, Zé Rodrigues, Mário Bezerra, Cajueiro, Cícero, Melado, Francisco Gomes e Expedito, auxiliares à gratidão!

A agricultura lhe foi pra si e a subir ganhos. O gado - ah, seu xodó! - lhe cobrava. Vou lembrar o dia aos suores da vacinação e o à poeira, brasa, sol quente, berros etc., quando vez de marcar, a ferro e fogo, cada rês, com os “ferros” “JHL” e “VPS” (Virgem Perpétuo Socorro); sinais crueis, certo, mas exigidos para, respectivamente, indicarem, na pele à perna traseira do bicho, quem seu dono e o município – dizia-se: “freguesia!” – ao qual, territorialmente, pertencia.

Uma coisa: João disse-me que, sem estar a ver o animal, acertava-o, se vacum ou outro, só pelo toque do chocalho! Cri. Afinal, tais sons e ecos ensinavam-lhe os tímpanos! A diferença - explicava- vem do jeito de o animal dar “a passada”. Ou, se o caso, de como puxa e repuxa a relva, ao pastar. Bom, hem!!!

João, duma eloquência atrevida porque saída só do são que ouvia de quem sabia “falar bem” (Pe. João Antônio, Tibúrcio,Gentil, Ezequiel.), foi indicado, à falta de, para ser o Promotor de Justiça. O vi em júris, onde, o juiz, Carlyle Martins e Cândido Couto, e Meton Vieira, defensor. Exerceu por duas décadas, até quando Lauro Erbster, recém-bacharel em Direito, e seu primo afim porque casado com Iolanda, filha de Carmina e Pedro, assumiu o cargo.

João, não político, ajudava políticos. Assim: com sua opinião e veículos ao transporte de eleitores. E matava um boi pro “dicomer”- lá em casa - a estes. Nunca se quis, sequer, a vereador. Ouvi dele ao ser consultado: - Não, compadre, porque vão dizer que o que tenho ou ganhar foi roubado! Mesmo ele só até aí, ganhou e perdeu eleições (PSD). Co-elegeu parentes, amigos, genro etc. Foi presidente da Associação Comercial e do Circulo Operário em Acopiara, e atuou nas Congregações: “Irmãos do Santíssimo” e a “Vicentina” (S. Vicente de Paulo).

Meu pai também tinha as suas! Alguém indagou: - Seu João, tou cum negócio com aquele que vai ali. O Senhor conhece todo mundo. Posso confiar nele? E meu pai, oh, largou: - Olhe! Eu não vou falar porque se eu fosse falar, teria de dizer que ele é velhaco. Assim, vou ficar calado. O sujeito torceu e quis mais. João, porém, abriu-se ao coisa-e-tal, gaveta pro nada, miolo de pote e o fim de papo!

Curiosidades? Tá...! João não via praia nem cinema. Saiu do Ceará só uma vez: Recife. Cantarolava - mais no banheiro! - o “Queremos Deus”; tantos hinos da fé; o do Círculo Operário e modinhas. Herdei isso bom, sem me sentir! Apelido: João Mamona (não vingou!). Formas como, por alguns, era chamado: Seu Joãozinho, Joorlanda e Seu João de Orlanda. Isso, melancólico, pelos com cheiro de roça e curral!

Bem. João, nosso querido pai centenário, nos amou! O amaram! Muitos! É amado! Cumpriu! Dizem que morreu... Eu? Umum! Ainda hoje faço o que ele gosta, pede e manda!

João, parabéns!

(*) Francisco Gurgel Holanda (Acopiara) advogado, desembargador, filho

 

 

Sebastião Gurgel Holanda

De Acopiara a Brasília na busca de novas perspectivas

 

Dezembro de 1971. A minha história, como um cidadão cujo coração já mais pertence à bela Capital que à saudosa Acopiára teve início há mais ou menos 40 anos. A verdade é que tudo começou quando em busca de novas perspectivas de vida, almejando alcançar o sonho de uma vida melhor. Saí em busca do “sonho americano” no “país do futuro”. Assim, me vi obrigado a deixar minha amada família - pais, irmãos, tios, avós, bons amigos, colegas de colégio, sem saber ao certo o que para mim Brasília reservara.

Quando cheguei a Brasília era véspera de Natal. Fazia frio aqui, o frio de um ar gélido e seco que até então eu desconhecia. Logo vinha o ano novo e uma vida nova em uma cidade ainda em construção, com terra vermelha e desenvolvimento acelerado no coração do Brasil. Brasília, Centro-Oeste, a Nova Capital da República. No coração do País, semeei o meu próprio coração.

Janeiro de 1972. Com 19 anos de idade, ainda jovem, me apresentei ao serviço militar na 10ª Região, QG do Exército, Esplanada, local onde o destino me escreveria uma nova história. Foi lá que consegui o meu Certificado Militar – documento de formação civil e militar – que me garantiria o direito de entrar no fechado e competitivo mercado de trabalho brasiliense.

Com o passar dos anos, ingressei, cursei e conclui o curso de caixa de banco e empresas financeiras do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC, e logo fui encaminhado para trabalhar em um mercado local chamado “JUMBO”, empresa posteriormente adquirida pelo Grupo Pão de Açúcar. Fora uma experiência inesquecível, ímpar e que me fez sentir abraçado pela Capital Federal. Neste momento, no coração nordestino semeado na terra vermelha do Planalto Central começavam a surgir as primeiras raízes. Apesar da vida de escasso tempo, pouco dinheiro, dificuldades de locomoção e moradia, com trabalho nos dois turnos do dia (manhã e tarde), eu ainda atravessava as frias madrugadas em ferrenho estudo para o vestibular que aspirava prestar. Meu sonho era cursar Administração de Empresas. E foi o que aconteceu. Com muita determinação e empenho, colhi os frutos do meu sacrifício e fui aprovado na Faculdade Católica de Brasília, hoje a grande Universidade Católica de Brasília - UCB. A felicidade irradiava, transpassava o peito, o coração batia em ritmo de baião e xaxado! Aprovado no dificílimo vestibular e logo na primeira tentativa de ingressar no ensino superior.

Março de 1985.Neste período o coração nordestino já havia firmado suas raízes no Planalto, comecei a trabalhar na Câmara dos Deputados. Centro político do Brasil. Era um sonho que mesmo quando sonhado de olhos fechados me parecia inalcançável e inacreditavelmente eu me via realizar.

Permaneci naquele órgão federal até a Constituinte de 1988. Porém, com muito pesar, fui obrigado a me desligar do Legislativo Federal, devido a uma inesperada mudança na Constituição Federal, que não permitia funcionários com menos de cinco anos de trabalho naquela Casa de Leis pudessem ser efetivados.Senti-me rejeitado, triste, ultrajado, como se todo o meu serviço prestado com empenho e amor de nada houvesse valido. Mas não esmoreci, resolvi permanecer firme no meu intento de ser um representante da saudosa Acopiára no coração do Brasil!

Os anos se passaram e me casei com a filha de um grande homem, músico,  maestro Cearense. Na minha incansável luta fui do serviço público à iniciativa privada. Com a minha esposa criei uma empresa que prestava serviços no segmento de buffet – Tia Lôla. Prestávamos serviços principalmente, no Teatro Nacional, na Telebrás e outros órgãos públicos. Permaneci com empresa até meados dos anos 90. Devido às circunstâncias da vida, me separei. Éramos imaturos, inexperientes, sem uma estrutura financeira estável e sonhos frustrados, razão maior de nossa separação, a bem dizer, separação amigável. Nesta ocasião meu coração parecia seco como as tortuosas árvores do cerrado ou como o árido solo do sertão nordestino. Era inegável em tal momento a enorme vontade em voltar para junto dos meus entes queridos. Mas bem sabia, todo sonho tem um preço, e como bom nordestino que sou decidi honrar o compromisso que havia feito comigo mesmo aos meus 18 anos de idade. Assim, mais uma vez, juntei forças e permaneci nessa cidade que tanto amava e amo.

Como as formigas trabalhadoras que encontramos aqui e acolá recomecei minha vida. Fui trabalhar em uma construtora de casas pré-fabricadas. Localidade, inclusive, em que conheci minha atual esposa, Sônia. Estamos casados há cinco anos. Com ela o tempo voa, sem ela o tempo para, mulher da minha vida, com quem decidi passar os meus finitos dias neste mundo e se o bom Senhor Deus permitir também no outro. Ela é amiga e companheira. Sua simplicidade, alegria e companheirismo me contagiam todos os dias e fazem amá-la cada segundo mais.

Fevereiro de 2004. Nesta época retornei a Câmara dos Deputados. Era o renascer do velho sonho. Desta vez como Assessor Parlamentar. Desde então não mais deixei a Casa do Povo. Venho coordenando e apresentando de perto trabalhos na Comissão de Orçamento da União, Lei Orçamentária Anual-LOA, definindo recursos para os Estados e Municípios, além de atender prefeitos, vereadores, deputados estaduais e todos os demais amados representantes de todo o povo brasileiro.

Com a bagagem de mais de 12 anos de experiência com a política nacional, me candidatei nas últimas eleições no pleito pelo cargo de Deputado Distrital. Como poucos desse Brasil, Candidato Ficha Limpa, de reputação irretocável e ilibada, com ética, moral e idoneidade indiscutívelrealizei uma campanha difícil e sem os inesgotáveis recursos financeiros dos tubarões da política, mas com muita coragem e vontade. Foi uma experiência inesquecível. E muito embora, não tenha sido eleito, fiquei na suplência do partido. Isto é, com possibilidade de assumir o cargo de Deputado Distrital.

Junho de 2011. Acopiarense de fibra, estou em Brasília há 40 anos. Saí da minha amada e saudosa cidade natal com sonhos e esperanças. No coração do Brasil firmei raízes, mas sem me esquecer dos dias da minha infância cheia de amor e carinho dos nobres cidadãos Acopiarenses. Em Brasília fiz meu recanto de amor e felicidades, grandes amigos e bons relacionamentos.

E assim foi que a semente de Acopiára foi semeada no Planalto Central, nascendo, enraizando, crescendo e florescendo, sem nunca deixar de se lembrar da sua origem.

Quero ouvir por muito tempo os cantos dos pássaros e dos sabiás em minha janela, Obrigado Brasília, sua realidade não e mais o sonho de Dom Bosco e de JK, e para esse brasileiro, és uma realidade. E obrigado Acopiára, local que Deus e meus pais escolheram para me dar a vida e me formar o caráter.(SGH)

 

 

Acopiara -  Nertan Holanda Gurgel. Auto retrato de um homem simples

Por JB Serra e Gurgel(*)

Meu pai está fazendo 95 anos bem vividos. Quando fez 90, em 2007, escreveu: “o que é isto? São 32 mil 872 dias e 12 horas, o mesmo número de auroras (Hoje, em 2011, quando faz 95 anos, terão sido 34 mil 675 dias). Lembro o velho sitio Recanto (de seus pais Francisco Gurgel Valente e Aurélia Holanda Gurgel) , o cantar do galo, orquestrado pelos pássaros silvestres, era um embalo. O cheiro de fumaça do bagaço de cana queimando na fornalha, ao iniciar a lida, o aboio do tangedor de bois ao redor do engenho.Tudo me cheirava bem.Até uma roupa de couro pendurada no cambito perto da minha rede  era o perfume da jitirana das quebradas da serra. Que saudades”.


(Não imaginava viver mais do que seu pai,meu avô, Francisco , nascido em 23.08.1893 e morto em 20.07.1988, com 94 anos 11 meses e 3 dias. Quando chegou aos 94,sempre que me ligava, dizia que poderia viver mais,mas teríamos que aguardar. Seu avô, meu bisavô, Henrique Gurgel do Amaral Valente, o Vovô do Rio, nascido em Aracati, Patriarca da família Gurgel do Amaral Valente de Acopiara, onde morreu, viveu 89 anos, (1865-1954), deixando cerca de 1.600 descendentes.  Hoje, é mais velho dos descendentes do Patriarca. Dois de seu irmãos, Nestor e Nicanor, passaram dos 90. Estava apenas acentuando que os padrões de vida do homem do interior melhoraram, com a água tratada,  vacinas, saneamento, educação, alimentação, moradia, renda  e solidariedade humana dos familiares)


“Nasci em Lages, depois Afonso Pena e hoje Acopiara, em 8 de junho de 1917, numa sexta-feira às 23 horas.Meu pai, senhor de engenho, foi um dos últimos coronéis do sertão que partiram desta vida.No dia 25 de agosto de 1940, contraí matrimonio com uma moça de Tauá, filha do senhor Nelson Nunes Serra e Tereza Aragão Serra. Maria Serra, como era conhecida, foi uma grande esposa, uma boa mãe, mulher de fibra, trabalhadora e de vontade própria. Eu, comerciante pobre com fama de rico.


“Em 1939, teve inicio a 2ª, Guerra que terminou em 1945.Meu capital era muito pouco e o da firma constituía-se de dinheiro do papai e dinheiro a juros de Almerinda Gurgel Guilherme (tia Neném) e da sra. Felícia Holanda Guilherme. Tinha nesse tempo em minha loja (A Casa dom Bosco na Rua Marechal Deodoro, a casa dos ricos e dos pobres...)um bom estoque de tecidos, chapéus e brinquedos (vende por preço barato, fazendas,rendas e bicos). As lojas em Acopiara eram muitas.


“Foi nessa época que o barco da vida entrou em mares agitados. Ondas gigantes, vagas profundas, vento uivantes sacudiam a nau.Por pouco não fui ao fundo.Os preços dos tecidos baixaram 40% e por isso muitos foram à falência, principalmente comerciantes de tecidos em grosso e  retalho.Somente passados quase dois anos, consegui aprumar a nau, entrando novamente em águas serenas.


“Aconteceu que Higino Alves Teixeira, cearense nascido em Acopiara, que negociava em Ipixuna, no Maranhã, veio de muda para Acopiara e montou uma loja vizinha à minha. Tornamo-nos amigos e até compadres. Conversa vai, conversa vem, acordamos em comprar arroz no Maranhão para vender no Ceará. Logo de início, tivemos bons lucros. Montamos uma usina de beneficiamento em Pedreiras, Maranhão. Chegamos a ter quase quatro mil sacas de arroz estocadas, parte paga e parte por pagar. Mas por conta do excesso de produção no Rio Grande do Sul, com incremento nas vendas para o Rio de Janeiro, os preços despencaram e o prejuízo foi arrasador: 300 mil cruzeiros (muito dinheiro na época).


‘O barco da vida, a nau que navegava em águas tranqüilas, mergulhou de vez em mares bravios. Por um momento não sabia se estava na proa ou na proa. Era como  uma cabaça deslizando em um rio caudaloso e encachoeirado . Salvamo-nos numa luta titânica, como se fôssemos turistas do transatlântico Titanic. Resolvi desistir da sociedade no Maranhão, saí de Acopiara e vim definitivamente para Fortaleza.


“A nau estava novamente em águas serenas, mas enfrentando tempestades! De inicio abri uma mercearia na Parquelândia. Não deu certo. Comprei um bar na Castro e Silva. Logo mudei de ramo e abri um restaurante. Depois passei para um açougue e , em seguida, para uma casa de peça para carros. Por último um depósito de material de construção, no bairro de Antonio Bezerra, que comprei do primo Henrique Gurgel de Souza.


“Em 1966,  minha filha Tereza ficou noiva, contraindo matrimonio no dia 31 de dezembro do mesmo ano. Para custear as despesas do casamento, vendi o depósito. Foi nessa ocasião que passei de patrão a empregado adotando a profissão de vendedor.


‘Vendia supercal, pó de pedra e granito ,minérios e calcáreos , do Sr. Amauri de Castro, tijolos furado, PM e combogós , da Cosmac de Sobral, bombas King, do Sr, Ivan de Castro, armadores de embutir do Sr, Crisanto, armadores de gancho do Sr, Zacarias, dobradiças e ferrolhos do capitão Nunes, sacos de plástico da Plastinion de São Paulo.Comecei a ganhar dinheiro. Deixei o mar das incertezas por um porto seguro. Sai do aluguel, comprei minha casa e cheguei a comprar carro zero., telefone, TV. 


“Hoje  viúvo, desde que Maria partiu, em 1995 , vivo no meu apartamento, no Montese, recebo minha modesta aposentadoria, meus dez filhos estão melhores do que eu. Uns em Fortaleza, outros em São Paulo (SP), Niterói (RJ), Linhares e Vila Velha (ES) e Macapá (AP). Tenho 30 netos 16 bisnetos . Muitos dos netos bem encaminhados, ocupando, criando, buscando seus espaços, com competência e fazendo a diferença, o que me orgulha e agradeço a Deus por tudo. Nada tenho a reclamar pois nada me falta. O que tenho para partir desta vida é suficiente.”.


JB Serra e Gurgel (Acopiara) jornalista e escritor, filho, com Nertan Holanda Gurgel (Acopiara), 95  anos, uma vida de lutas, desafios,decência e dignidade.

 

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